Imagine só: você termina suas compras em um supermercado, segue sua vida normalmente e, de repente, é surpreendida no banheiro de outro estabelecimento com batidas violentas na porta e acusações de furto gritadas a plenos pulmões. Foi exatamente isso que aconteceu com uma vendedora de chup-chup em Igarapé, região metropolitana de Belo Horizonte, em março de 2023. 3p3j3o
O caso, que parece saído de um filme de suspense mal roteirizado, ganhou os corredores da Justiça mineira e terminou com uma decisão que deveria servir de lição para estabelecimentos comerciais de todo o país: a 15ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais manteve a condenação do supermercado ao pagamento de R$ 10 mil por danos morais à consumidora.
A história é tão absurda quanto constrangedora. A mulher, que trabalha como vendedora autônoma de chup-chup, estava apenas fazendo compras para seu negócio quando foi transformada em “criminosa” da noite para o dia. Após visitar um primeiro supermercado e não encontrar tudo o que precisava, ela simplesmente atravessou a rua e entrou em outro estabelecimento.
Foi quando o pesadelo começou. Ao usar o banheiro do segundo supermercado, a vendedora foi surpreendida por batidas violentas na porta. Do outro lado estava ninguém menos que o filho do proprietário do primeiro estabelecimento, acusando-a aos berros de ter furtado produtos.
O mais irônico é que, quando a consumidora concordou em voltar ao primeiro supermercado para verificar as imagens das câmeras de segurança, ficou comprovado que ela não havia furtado absolutamente nada.
Diante da situação absurda, a mulher fez o que qualquer cidadão consciente de seus direitos faria: chamou a polícia e registrou um boletim de ocorrência. E ainda bem que o fez.
Na Justiça, o supermercado tentou se defender alegando que a mulher teria visitado o estabelecimento por último, e não antes como ela afirmava. Uma defesa frágil que não se sustentou diante das provas testemunhais apresentadas.
O juiz Gustavo César Sant’Ana, da 1ª Vara Cível e Juizado Especial Cível da Comarca de Igarapé, não teve dúvidas ao condenar o estabelecimento. Para o magistrado, a acusação infundada expôs a intimidade e feriu a honra da consumidora de maneira irreparável.
Inconformado com a decisão, o proprietário do supermercado recorreu, mas a desembargadora Ivone Campos Guilarducci Cerqueira manteve a sentença inicial. Em seu voto, a magistrada destacou o caráter constrangedor e público da abordagem, realizada dentro do banheiro de outro estabelecimento, e classificou o episódio como “abuso de direito e violação da honra subjetiva”.
Os desembargadores Maurílio Gabriel e Octávio de Almeida Neves acompanharam o voto da relatora, formando unanimidade na decisão.
O caso levanta uma questão crucial sobre como estabelecimentos comerciais lidam com suspeitas de furto. Especialistas em direito do consumidor são unânimes em afirmar que, mesmo diante de suspeitas, os comerciantes precisam agir com cautela e respeito à dignidade humana.